quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Aqui anda coisa

O relatório «Crescimento e Desigualdades», divulgado esta semana pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE), afirma que Portugal é um dos países onde é maior o fosso entre ricos e pobres. Garante ainda o documento que em matéria de desigualdades na distribuição da riqueza o nosso País ombreia com os Estados Unidos, apenas atrás da Turquia e do México.
Trata-se, obviamente, de uma cabala contra o Governo Sócrates. Mais grave ainda, trata-se de uma gigantesca maquinação visando desacreditar os sucessivos governos PS e PSD – com ou sem o valioso contributo do CDS – que geriram os destinos nacionais, bem como os muito democráticos governos da imensa maioria dos países que integram a OCDE, pois segundo o referido estudo as desigualdades sociais não têm parado de aumentar nos últimos 20 anos.
«Em três quartos dos 30 países da OCDE, as desigualdades de rendimentos e o número de pobres aumentaram durante as duas últimas décadas» – lê-se no relatório, que vai ao ponto de afirmar que «as famílias ricas melhoraram muito a situação» em relação às mais pobres e que «o risco de pobreza se deslocou das pessoas idosas para as crianças e os jovens adultos».
Ora isto não faz sentido nenhum, tal como não faz sentido dizer que a pobreza das crianças se «situa hoje acima da média geral» – a OCDE considera que existe uma situação de pobreza quando os rendimentos são inferiores a 50 por cento da média de cada país –, pelo que «deveria chamar a atenção dos poderes públicos».
Estamos em crer que Michael Foerster, um dos principais autores do estudo, deve ser um perigoso terrorista, pelo que a esta hora já deve ter a cabeça a prémio no glorioso mundo capitalista, onde como se sabe a justiça social é um valor inestimável, como não se cansam de repetir nas mais diferentes línguas os governantes de serviço.
Veja-se o caso de Portugal, por exemplo. De Cavaco (primeiro-ministro) a Sócrates, passando por Soares ou Durão, Santana ou Guterres, sempre, mas sempre as políticas seguidas no País visaram a protecção dos mais desfavorecidos, a defesa dos interesses dos trabalhadores, o progresso social, o crescimento da economia, o desenvolvimento social.
E os resultados alcançados foram sempre, mas sempre um sucesso, e se ano sim, ano sim houve que pedir sacrifícios aos sacrificados alvos dessas políticas foi para conseguir mais e melhor. Ainda agora o Governo acaba de disponibilizar 20 mil milhões de euros do erário público, ou seja, do nosso dinheiro, aos bancos, em nome dos supremos interesses nacionais, evidentemente.
O mesmo se poderia dizer de qualquer dos restantes países da OCDE, onde o «fim da História» foi saudado como a prova inequívoca da superioridade moral e material do capitalismo. E vem agora um senhor Foerster qualquer, de dentro da barriga do sistema (sim, que a OCDE faz parte do sistema) dizer que afinal não só está tudo mal como vai de mal a pior?!!! Não pode ser.
Aqui anda marosca, e da grossa. Das duas, três: ou a OCDE perdeu a cabeça, ou vem aí borrasca. Curiosamente a organização aconselha os países membros a fazer «muito mais» para que as pessoas trabalhem mais, embora reconheça que só o trabalho não chega para evitar a pobreza, pois «mais de metade dos pobres pertencem a famílias que recebem fracos rendimentos de actividade».
Ou nos enganamos muito, ou isto quer dizer mais trabalho para salários de miséria.

Anabela Fino no jornal "Avante"
 
RESISTIR POR UM MUNDO MELHOR