quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Melo Antunes no 25 de Novembro

O propósito da data e do que se vai dizendo por aí vale a pena ler este texto, que sob o título Combates da memória (35), Vítor Dias publicou no seu o tempo das cerejas*:

O advogado e deputado do PS, Joaquim Sarmento, publica na edição de hoje do Público um artigo intitulado «Melo Antunes, émerito fundador da democracia portuguesa» que, em diversos pontos, me merece reservas que entretanto não tratarei neste «post».

Não, o que pretendo anotar é que Joaquim Sarmento, tal como vários antes dele, escreve que «ao declarar perante as câmaras de televisão na noite de 26 de Novembro que o Partido Comunista era indispensável à democracia, Melo Antunes ganhou a admiração de todos os democratas, incluindo aqueles que queriam atravessar o "Rubicão" com um exército de elefantes domesticados.»
 
Ora, cada um de nós, pode, à distância de 34 anos, entender que se Melo Antunes tivesse falado da indispensabilidade do PCP para a democracia talvez essa expressão fosse mais conforme com as realidades políticas objectivas da época.

Mas a verdade é que, historicamente e certamente não por acaso ou lapso, não foi isso que Melo Antunes disse.

Com efeito, como qualquer gravação da RTP ou consulta de jornais da época comprovarão, do que Melo Antunes falou naquela noite foi da insipensabilidade do PCP «para a construção do socialismo».

E, como é bom de ver, por mais anos que tenham passado, ninguém tem o direito de emendar ou alterar o que Melo Antunes efectivamente disse.

É que ele disse o que disse, e não outra coisa, porque essa era a linguagem da época mesmo já depois do 25 de Novembro, uma linguagem que, por razões políticas e sociológicas, estava ainda mais à esquerda do que as realidades políticas e as verdadeiras correlações de forças.

E se alguém tiver dúvidas sobre isto, é só ir à procura dos comunicados emitidos pela Presidência da República durante a crise do 25 de Novembro de 1975, quase todos escritos pelo Ten-Coronel Ferreira da Cunha, e aí facilmente verificará que a esquerda militar e os militares na órbita de Otelo eram tratados como «contra-revolucionários» enquanto os Nove e os seus aliados militares (bem menos recomendáveis) eram qualificados de verdadeiros «revolucionários».

Aliás, só para contrariar certas ideias feitas e demonstrar que a vida tem as suas surpresas, ainda um dia hei-de aqui contar aspectos das reuniões pós-25 de Novembro de delegações do MDP primeiro com uma delegação do Conselho da Revolução e depois de reuniões de trabalho para a elaboração do 2º Pacto MFA-Partidos em que participei com Ramalho Eanes e Melo Antunes e surprendemente pautadas, não por uma atitude «vencedores» versus «vencidos«, mas por uma assinalável cordialidade, afectividade e quase sintonia política, a par de uma patente acrimónia e desgosto por parte desses militares com atitudes de Mário Soares e do PS.
 
RESISTIR POR UM MUNDO MELHOR