segunda-feira, 6 de junho de 2011

Consolidação e avanço da CDU. A luta tem de continuar !

Com os resultados praticamente definidos, despeço-me desta noite eleitoral com as seguintes observações alinhadas ao instante e sem nenhuma hierarquização muito ponderada ou especial profundidade:

1 - Os resultados quase finais falam por si e atestam: uma clara derrota e um severo castigo eleitoral do PS (perda de 8 pontos percentuais em relação a 2009 e da posição de partido mais votado), o que significa que o seu desgaste e relativo isolamento eram tão grandes que nem conseguiu aproveitar a série de tiros no pé dados na campanha do PSD, de nada adiantando que o PS venha culpar o PCP e o BE pelo ascenso da direita porque o PS é que foi vítima de si próprio e da sua política e, depois de ter andado anos e anos a alimentar tigres (a direita) com bifes, não se pode queixar que os bichos já não se contentassem com ossos ou cenouras; uma expressiva vitória eleitoral do PSD, que conatndo com o CDS lhe dá direito a formar governo, baseada mais no cansaço com Sócrates e o governo do PS do que nos méritos ou esperanças com o PSD e o seu programa; um crescimento eleitoral do CDS que acaba por ser afectado por ficar longe das expectativas criadas pelas sondagens e cavalgadas por Paulo Portas, que beneficiou outra vez da regular amnésia sobre o seu passado como governante e alguma coisa deve ter beneficiado da táctica de se distanciar da vertigem ultra-liberal do PSD (coisa que meterá rapidamente na gaveta em troca de umas pastas governamentais); atentas as difíceis circunstâncias destas eleições, um significativo e importante resultado da CDU que, nas forças à esquerda da direita, é a única que regista um crescimento eleitoral e que elege mais um deputados ( por Faro, onde não elegia há 20 anos); uma séria quebra eleitoral do BE (menos 4,5 pontos percentuais do que em 2009) o que parece confirmar a volatlidade e outras características específicas de parte significativa do eleitorado deste partido.

2 - Nas suas linhas gerais ou mais determinantes, os resultados das eleições de hoje não são separáveis de um conjuntura de excepcional crise económica, financeira e social e de um contexto de poderoso condicionamento das opções dos leitores que, em 4/4, descrevi aqui assim: «julgo estar em marcha um nunca visto (e de contornos absolutamente asfixiantes) movimento de opinião publicada no sentido de expropriar as próximas eleições de conteúdos que, por definição, lhe deviam ser intrinsecamente inerentes, e de amarrar e formatar, em cínico nome do «pragmatismo» e de um suposto «estado de necessidade», as opções dos eleitores a um limitado quadro de escolhas de voto, alegadamente sustentado ou ancorado no ponto a que, em diversos domínios, o país chegou.» E que voltei a caracterizar em artigo escrito em 5 de Maio nestes termos : «não hesito ainda assim em sublinhar que, nunca depois do 25 de Abril, umas eleições decorreram ou se perfilaram num clima de pressão política e ideológica tão poderoso, persistente, sistemático e perigoso com vista a conformar as consciências e aprisionar a vontade dos cidadãos como o que se desenha para as eleições de 5 de Junho próximo. (...).Com efeito, todos os dias e semanas desfilam perante os nossos olhos na imprensa escrita e televisão e pelos nossos ouvidos nas rádios batalhões de comentadores, jornalistas, economistas, empresários e dirigentes políticos todos insistindo na inevitabilidade de certas medidas desgraçadas e brutais, todos proclamando a falta de alternativas credíveis ou razoáveis, todos baptizando o PS, o PSD e o CDS de «arco governativo», todos tratando o PCP e o BE como partidos de protesto e, numa falsidade do tamanho de uma catedral, apresentando-os como voluntariamente afastados de apetências de exercício governativo, todos no fundo trabalhando premeditada e activamente para que as eleições seja um simulacro democrático no qual, por causa das medidas acordadas pela troika portuguesa -PS, PSD e CDS – com a troika estrangeira – FMI, UE e BCE - estaria proibida a livre expressão de uma real vontade de mudança.»

E agora já posso dizer o que antes não podia: é que esta caracterização continha implicitamente a perfeita noção e consciência de que só assinaláveis voluntarismos, superficialidade ou inexperiência política podiam levar a pensar que os partidos à esquerda do PS desfrutavam de condições excepcionalmente favoráveis nesta batalha eleitoral em vez de terem pela frente, como sempre pensei, uma batalha dificil e especialmente complexa e exigente. Na verdade, raramente na história recente aconteceu que climas de angústia e certa desorientação colectiva, de medo do presente e do futuro, de aprisionamento numa barragem de factos consumados e de soluções asfixiantemente apresentadas como as únicas «credíveis» ou«exequíveis» fossem promissores territórios de espectaculares progressões eleitorais de forças de esquerda mais consistentes ou consequentes.

Neste sentido e no fim de uma campanha em que PS, PSD e CDS fugiram como o diabo da cruz da discussão do memorando de submissão e desgraça que tinham assinado como a troika estrangeira, não é de admirar que, em conjunto, os partidos com responsabiliades governativas nos últimos 35 anos, variações entre si à parte, não tenham sofrido o castigo eleitoral que claramente mereciam, continuando a beneficiar de comportamentos eleitorais de cidadãos em que entram coisas tão diversas e tão próximas como um dominante apego ao impulso para mudar de caras com secundarização das políticas, para a alternância sem alternativa, para o baralhar e tornar a dar e para uma nova confirmação de que muitíssimos passam o ano a dizer que «os partidos são todos iguais» mas afinal, no momento do voto, lá desarrincam alguma diferença que pesa nas suas escolhas limitadas.

3 - No plano dos resultados, parece-me ainda merecerem registo três dados principais: o primeiro é que, com toda a probabilidade, assistiremos à formação de um governo de coligação entre o PSD e o CDS sustentada numa maioria de deputados mas numa maioria eleitoral quase tangencial dado que a votação de PSD+CDS deverá andar à volta de 5o,37% (!!!) dos votantes ; o segundo é que, na linha dos resultados de 2009, volta a confirmar-se a interrupção do ciclo que durou de 1995 a 2005 em que o partido mais votado o era com percentagenss de votos acima dos 40% (de 40,2% a 45,3%) ; o terceiro é que, tal como já acontecera em 2009, os partidos do «bloco central» - PS e PSD - somam em conjunto cerca de 66,6% , portanto abaixo dos valores que atingiram entre 1987 e 2005 ( em que essa soma oscilou entre os os 72,4% e os 79,7%) .

4 - Como não sou um comentador independente, neutral ou isento (quando encontrarem um ofereçam-mo que levo-o para um museu) mas um comunista e velho combatente político, ninguém estranhará que, em particular, daqui fraternamente saude todos os militantes do PCP e do PEV, todos os activistas da CDU, todas as mulheres, homens e jovens que, com um esforço e abnegação que, quantitativa e qualitativamente, são singulares nas campanhas eleitorais construiram através da acção e da luta anteriores e da intervenção nesta campanha este bom resultado da CDU que, estando longe daquele que merece e de que a democracia precisa, representa um importante estímulo para que os comunistas e todos os outros democratas agregados na CDU prossigam com força e confiança renovadas as batalhas para vencer as densas ameaças e excepcionais perigos de retrocesso social que se perfilam não apenas para os trabalhadores mas para a maioria da população.

5 - Como tem acontecido, e o hábito não atenua a mágoa por assim ter voltado a ser quando se perfilam já para as próximas semanas uma calvalgada infame de agravamento das condições de dos portugueses, centenas de milhar de eleitores votaram nos partidos que não apenas aqui nos conduziram mas também estão comprometidos até à raiz de cabelos como todo um programa de orientações e medidas concretas que atingirão duramente os interesses objectivos dessas centenas de milhar de eleitores em agressões com que se virão a irritar e indignar mais à frente, atitude que tem causas muito complexas mas em que pesam também muito poderosamente os factores e circunstâncias referidos no ponto 2. Entretanto, é preciso não confundir compreensíveis desabafos individuais de sofá em noite eleitoral sobre esta situação com linhas de orientação política para o futuro. É que, como a luta tem de continuar e as eleições não decidem tudo, o que é preciso deixar claro é que serão bem-vindos às lutas todos e todas os portugueses e portuguesas que felizmente e em boa hora o queiram, independentemente da forma como votaram neste domingo e mesmo que não tenham votado.

Só para ninguém se esquecer do contexto mediático que sempre envolve e enevoa as legislativas portuguesas

Vítor Dias no o tempo das cerejas*
 
RESISTIR POR UM MUNDO MELHOR